PIONEIRAS – Mulheres de Aparecida: simples, mas fortes em sua essência
Postado em 06/05/2020
ESPECIAL – HISTÓRIAS vividas e contadas de nossa gente aparecidense – por Wenina Miranda
A doçura e simplicidade no olhar de quem viu a cidade nascer. Dessa forma que as pioneiras do município Glória, Madalena, Pedra, Luzia, Joana, Dude e Nati relatam a história de suas vidas, que se confunde com a própria trajetória da cidade.
CORAGEM, FÉ e muita DEDICAÇÃO são algumas das características mais fortes presentes na trajetória das pioneiras do município de Aparecida do Rio Negro, que dedicaram boa parte de suas vidas na construção do que hoje tem se tornado o município. Essas mulheres SIMPLES, mas FORTES em suas ESSÊNCIAS, desbravaram o sertão com garra e, cada uma ao seu modo, marcou a história da cidade.
Aqui apresentamos um pouco mais do legado de Maria da Glória, Maria Madalena, Pedra Pereira, Luzia Maciel, Joana Lino, Maria de Jesus, mais conhecida como Dude, Maria da Natividade, ou dona Nati. Cada uma, do seu modo, com suas peculiaridades, revelam em seus olhos, nas mãos calejadas e nos sinais de expressão o amor por Aparecida, relembrando fatos que marcaram suas vidas, como boas lembranças e também as perdas e dificuldades.
Nesta matéria especial, pretendemos valorizar a cultura local e resgatar as memórias das pioneiras, para não deixar que a história de lutas e vitórias, que marca o desenvolvimento do município, caia no esquecimento.
Cada uma, do seu modo, com suas peculiaridades, revelam em seus olhos, nas mãos calejadas e nos sinais de expressão o amor por Aparecida.
Humildade e Coragem representam “dona Glória”
As marcas de expressão da idade não tiraram dela a beleza da mulher que luta e trabalha, e que por uma vida inteira se dedicou à família. O trabalho do lar a fortaleceu e deu dignidade. Dona Maria da Glória Santana, de 80 anos, nasceu na Bahia, às margens do Rio Arrojado, no município de Correntinha.
A seca gerou dificuldades para a família de dona Glória e foi um dos grandes obstáculos para a sobrevivência na Bahia. “A gente tinha que buscar água longe, com o balde na cabeça”, relembra Glória.
Ainda na Bahia se casou aos 16 anos com seu Pedro Nelson Santana, e teve os seus 13 filhos, sendo que um viveu apenas seis meses.
Em 1976 resolveram deixar a terra seca e buscar melhorias no norte Goiano. “Então, meu marido conheceu esta terra, comprou fazenda aqui e eu o acompanhei. Vim com todos os filhos pra cá em 1976. Aqui não tinha nada, era só fazenda. Quando chegamos, quem ajudou a construir nossa cidade foram as irmãs, principalmente a Irmã Terezinha e Irmã Irene. Aqui não tinha água encanada. Então elas mandaram instalar uma torneira ali onde era a antiga prefeitura, onde tinha um salão que era a igreja. Nessa torneira não faltava gente, o povo ficava ao redor vendo aquilo e buscando a água”, conta a pioneira, relembrando o passado que vivenciou em Aparecida.
Hoje, para ela, as coisas são mais fáceis. “Nem se compara com o que já passamos aqui. Tenho certeza que de alguma forma, por meio da minha família, contribuímos para o desenvolvimento dessa cidade”, afirmou.
Os 64 anos de casamento são a base da família que até hoje se reúne para as comemorações. “O segredo é ter paciência, ter fé, caminhar juntos. As coisas mudaram, mas o que fica é o amor, e até hoje a determinação para ver os netos crescidos e formados”, ressaltou.
Com o ofício de costureira, por muito tempo as costuras para fora ajudaram no sustento dos filhos. Hoje ela ainda se dedica à função, mas só para casa e quando consegue manusear a máquina, que até hoje é manual.
Mulher de fé: esse é o principal adjetivo de dona Glória. A vivência na Igreja católica é o seu ponto de apoio. “Fui ministra da Eucaristia por 16 anos, e tenho muitas saudades. Hoje já não posso mais ser ministra por causa do problema da tremura nas mãos, mas mesmo assim vou todo domingo, e todo dia de manhã faço a minha caminhada e faço as orações.
Histórias de amor pelas tradições cristãs fazem parte da vida da pioneira, que também gosta muito de participar do Grupo de Idosos “É Preciso Saber Viver!”. “Eu acho muito bom, participo das coisas, dos encontros, das festas, de dançar. Pra mim enquanto eu puder, eu vou participar”, reforçou.
Madalena: Mulher que chora, canta e encanta
Com o sorriso largo no rosto, dona Maria Madalena Pereira de Carvalho, mais conhecida como Dona Madalena, foi uma das primeiras professoras da região que hoje se conhece por Aparecida do Rio Negro, onde chegou com 11 anos de idade, em 1959. “Naquela época não tinha escola, o estudo era nas fazendas. Com 14 anos comecei a dar aulas”, lembra Madalena. Como era muito nova, a professora se tornava amiga das alunas, como relembra de forma divertida, “juntas, a gente banhava no rio, brincava, se divertia bastante”, conta.
Sempre determinada e muito segura, Madalena já mostrava desenvoltura na infância, nas apresentações que fazia em público no Colégio Batista de Tocantínia. Essa habilidade na oratória e em se expressar contribuíram tanto em sala de aula quanto no parlamento, quando foi eleita para ser a primeira vereadora do município, logo após a emancipação, na primeira legislatura, em 1989.
Dona Madalena conta que nunca teve pretensão de ser política, mas cresceu vendo seu pai, Fortunato Pereira Pinto (in memorian), envolvido na área. “Meu pai toda vida foi político, era bom de conversa e muito carismático. Tinha muitos amigos! Desde pequena eu cantava as músicas de campanha e as pessoas gostavam de me ouvir. Nunca trabalhei no pensamento de ser política, mas sempre gostei de ajudar as pessoas, então, quando a cidade se emancipou, muitas pessoas me incentivaram pra eu ser candidata”, relembrou.
Madalena permaneceu apenas por um mandato, pois não teve interesse de continuar, “o vereador só pode pedir, não tem autonomia para realizar, então, me desmotivei para continuar na vida pública, mas lembro que ainda conseguimos fazer as cabeceiras da ponte da Rua 7 de setembro”, destacou. Madalena deu outra grande contribuição em seu mandato como vereadora: escreveu a letra do hino do município. “Houve essa necessidade e como eu sempre gostei de escrever, fiz uma proposta, apresentei na Câmara, cantei para os demais vereadores e foi aprovado”, disse.
Mesmo desistindo da vida pública, o gosto pela política passou para o seu filho primogênito, Mem de Sá, que aos 24 anos ingressou na vida pública e foi vereador por cinco mandatos consecutivos. E com muita firmeza e determinação, expressou em toda sua trajetória política o bom senso, posição sublinhar de sua mãe.
Casada com o senhor Deusdete de Carvalho há 50 anos, Madalena relembra que não foi fácil o período da conquista. “Conheci ele em uma viagem de caminhão vindo de Tocantínia para cá. Ele se apaixonou à primeira vista e procurava me chamar a atenção de todas as maneiras, mas, somente três anos depois, nos casamos”, relembra sorrindo.
Ao relatar sua história, a pioneira destaca que o momento mais difícil que enfrentou foi a morte do pai, há 18 anos, quando emocionada relata. “Apesar do tempo, perder meu pai é algo que nunca superei, foi uma perca irreparável. Sempre fomos muito próximos, puxei a ele na determinação, fui muito bajulada por ele. Ele teve seis filhas mulheres e o sonho dele era ter um filho homem, portanto, enquanto esse homem não chegava, ele me tratava como se eu o fosse e assim sendo, me ensinou caçar, selar animal, atirar, enfim, viajava e fazia tudo com ele”, relatou emocionada.
Como mãe, Madalena afirma ter sido rígida e zelosa com os sete filhos que teve. “Sinto que fui exigente demais, sempre tentando proteger, conduzir e passar valores. Todos eles são formados e obedientes. Continuo sendo exigente, protetora, e faço questão de saber tudo da vida de todos eles. Hoje vejo meus filhos todos dentro da igreja, o que é uma grande alegria pra mim. A principal realização de minha missão como mãe, foi conduzi-los aos caminhos do Senhor, ser crente fiel e honesto, deve ser o foco principal de toda pessoa”, reforçou.
Ao falar sobre Aparecida do Rio Negro, Madalena ressalta a importância que a cidade tem para ela. “Aparecida representa tudo pra mim, me sinto orgulhosa de ter feito parte da sua criação”, relatou. Hoje com 72 anos, Madalena tem 14 netos e um bisneto. É responsável pelo Cartório de Registro Civil desde 1994, após ter passado em concurso realizado pelo Estado.
A Pedinha do seu Zome: Matriarca de uma família de referência
Matriarca de uma família que é referência para o município, tanto religiosamente como na parte educacional, a mãe do atual prefeito Deusimar Amorim, dona Pedra Pereira de Amorim diz que se sente realizada com as conquistas obtidas durante toda a vida, e com o desenvolvimento da cidade, que teve a contribuição dos seus pais e filhos.
A história de Aparecida do Rio Negro é paralela à vida de dona Pedra. Filha de um dos fundadores do Município, senhor Domingos Rios, a determinação para a criação dos filhos por meio da educação escolar e religiosa marcaram a vida desta mulher de 83 anos, que veio do Maranhão com os pais quando ainda era criança, e desde então, sustenta uma história de fé, lutas e vitórias alcançadas ao longo da vida.
Desde que chegou o pai trabalhava como vaqueiro, por muitos anos na fazenda de seu Supercílio Barbosa, figura importante no cenário histórico da cidade. Lá ela aprendeu, por meio dos estudos pagos pelos pais, a ler e escrever, fazendo até a 4ª série. Ao se casar aos 21 anos, ela logo se mudou para a casa da sogra, onde também ajudava nos serviços da roça, e em seguida, para uma das primeiras casas do centro de Aparecida do Rio Negro, em frente à Praça José Eurico Costa.
O Setor São Domingos era uma fazenda pertencente ao pai de dona Pedra, e onde hoje se situa a casa em que ela, ao lado do marido, reside há mais de 20 anos. O casamento com seu Deocleciano Batista de Amorim, popularmente conhecido como “Seu Zome”, foi como mandavam os pais: arranjado. “Conheci ele só de ouvir, pois meu pai, é que já conhecia a família dele e disse que era uma boa pessoa, trabalhador, bonito. A gente conhecia só de ouvido e não de olho, eram as referências que a gente tinha que contavam naquela época”, mencionou.
São 60 anos de casados, que resultaram em uma família de 10 filhos, 22 netos e uma bisneta. As referências religiosas vieram com a recepção das freiras que fizeram parte da história do Município, assim como do famoso Padre Pedro, que sempre visitava a Cidade.
Além da criação dos filhos, dona Pedra se dedicou aos cuidados dos sobrinhos, sogra, mãe e pai. Dona Irrailde Azevedo, sobrinha e filha de criação, já foi primeira dama de Aparecida, cresceu junto com a família, em sua infância, juventude, permanecendo até hoje. Segundo Pedra, uma filha muito querida. “Sou muito feliz também com o sucesso dos sobrinhos, que ajudamos a cuidar durante algum tempo e nos orgulhamos muito de todos eles”, relembra feliz.
Na vida de Dona Pedra muitos obstáculos já foram superados, mas para ela, o pior foi a morte da sogra e da mãe. “Eu sinto saudades… fui muito feliz com elas”.
Ter uma mesa farta e os filhos reunidos é a maior alegria para a matriarca. Hoje, a pioneira se dedica a recepcionar os filhos e netos, e aos cuidados com o marido. “Apesar de não poder passar por fortes emoções, ainda comando a cozinha, tenho a ajudante, mas ainda dou conta de tratar os frangos quando os filhos vêm. De vez em quando a gente visita alguém e tem o acompanhamento médico de sempre,”, completou.
Luzia Tavares: Devoção que sustenta uma vida
Aos 85 anos, dona Luzia José Tavares Maciel tem na fé e na crença em Deus a sustentação de sua vida e família. Mulher humilde, de olhar singelo e doce, mostra que a vida não precisa ser complicada ou cheia de afazeres, mas que é possível desfrutar dos pequenos momentos com serenidade.
Com 23 anos, dona Luzia se casou com o senhor Antonio Maciel Bastos (in memorian), com quem teve seis filhos, sendo quatro mulheres. Ao relembrar do marido, dona Luzia destaca, “Ele veio do Maranhão e era muito bonito. Os meninos puxaram a ele, grandes e bonitos”, conta com olhar saudoso. A pioneira enfrentou duras perdas, primeiro a do filho Anunciato Tavares, em 1981, depois a do esposo em 1990 e do seu outro filho, Antonio José Tavares Maciel, em agosto de 2015. A pioneira relata que foram momentos difíceis de superar e que deixaram um grande vazio em seu lar.
Em julho de 1968 dona Luzia e sua família chegaram a Meira Matos. Antes, moravam na Fazenda São Bento, saída para Novo Acordo. Seu Antonio foi vereador em Novo Acordo e sempre priorizou os estudos para os filhos. “Maria da Graça, minha filha mais velha saiu de casa com 08 anos para estudar em Novo Acordo na casa da avó materna, depois foi para Miracema, Goiânia e Brasília, onde foi morar com a avó. Amélia estudou em Tocantínia, Miracema e Brasília”, afirmou ressaltando que todos os filhos tiveram oportunidade de estudar.
A pioneira e seu esposo foram a segunda família a residir onde hoje é o Setor São Domingos. Os primeiros foram seu Domingos e dona Simiana, pais da Dona Pedra Amorim, com quem até hoje dona Luzia cultiva uma forte relação de amizade e companheirismo.
A chegada ao povoado Meira Matos, que se tornou Aparecida do Rio Negro, se deu em busca de educação para os filhos. “Quando cheguei aqui já estava casada. Viemos para colocar os meninos para estudar e morar também”, relatou dona Luzia que relembra que morou em vários locais, como próximo ao Rio Perdido, onde hoje é Rio Sono e também na região de Novo Acordo. “Meu pai se mudava muito por causa da criação do gado. Depois que casei viemos para cá e por aqui mesmo ficamos até hoje”, ressaltou.
A crença em Deus é ressaltada como uma das principais áreas de sua vida. “Sempre fui católica, nunca pensei de mudar. A firmação da gente é em Deus mesmo, não tenho devoção em nenhum santo específico. Toda quinta e domingo estou na igreja, pra agradecer e também pedir a graça de Deus”, destacou.
Dona Luzia foi professora do Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral) nos anos 60. Lembra que houve uma enchente do Rio Negro que derrubou sua casa, ao lado da antiga moradia o seu esposo construiu outro casarão, onde mora até hoje com sua filha adotiva, Mariquinha, já que os demais saíram para estudar em Brasília e em outros locais e formaram famílias em outras cidades. “Sempre quis continuar aqui no casarão, morei muito tempo aqui só, mas a gente nunca se acha só. Nunca tive vontade de morar fora, acostumei, gosto de Aparecida”, frisou.
Luzia conta que uma tristeza para ela é ver como está o Rio Negro hoje, com menos volume de água. “Naquela época o rio era bonito, cheio, a gente banhava nele. Hoje tá secando, muita gente joga lixo nele, uma tristeza”, afirmou. E ainda ressalta a vida simples e tranquila que possui. “Cuido das galinhas, faço uma comida, vou à igreja. Graças a Deus me sinto bem aqui, a cidade é boa e as coisas estão melhorando”, reforçou.
Joana Lino: Exemplo de mulher determinada e pilar da família
Simples, com sorriso no rosto e demonstrando muita garra, dona Joana Lino de Sousa Teixeira, de 81 anos, é exemplo de mulher determinada e de pilar da família. Mãe de 12 filhos, com 26 netos e 8 bisnetos, Joana é hospitaleira, recebe a todos com muita fartura, alegria e gosta de ter sua casa na Fazenda Boa Vista sempre cheia.
Filha da região, dona Joana nasceu na Fazenda Gavião, distante a 6 Km de Aparecida do Rio Negro. Foi casada com José Teixeira Lino, conhecido por todos como Zequinha. Muito hospitaleiro, seu Zequinha sempre abrigava a todos que passavam pela região. “O povo gostava dele demais. A casa de Zequinha Teixeira era ponto de referência e sempre vivia cheia. Recebi os primeiros moradores do Meira Matos, muitas vezes aqui era dormitório de viajantes, a gente colocava rede, colchão no chão. A gente matava uns frangos, fazia comida, sempre tivemos a mesa farta”, lembrou.
O lugar onde vive há 59 anos trazem boas lembranças. “Aqui nasceram meus filhos, aqui sobrevivemos da força do braço do meu marido que criava gado e plantava roça. Os meninos iam pro colégio pra estudar, sempre fui uma mãe presente mais não gostava de bater. Já Zequinha batia mais, dava conselhos compridos”, ressaltou.
O estudo foi pouco, como conta dona Joana. “Estudei particular em Novo acordo até o 3º ano, para saber ler e escrever, fazer contas”, disse. A presença sempre marcante da família também foi destacada, “os filhos foram embora, mas a casa nunca ficou vazia. Sempre tem os netos, bisnetos, conhecidos, compadres e comadres, os afilhados que vem me visitar”.
Dona Joana cedo se casou, com 19 anos, com seu Zequinha que era recém-chegado de Lizarda. “Casei com 19 anos e ele com 22. A mãe dele era sobrinha do meu pai. Vivi com ele 55 anos, a gente sente falta, ele foi meu primeiro e único namorado e eu também fui sua primeira namorada. A gente era muito amigo, conversava abertamente, dividia os problemas, e fomos companheiros. Eu tenho certeza que tive um marido fiel assim como eu fui, isso é gratificante, não tem pecado que eu carregue nisso”, ressaltou emocionada.
Ao relatar o falecimento do seu esposo ocorrido em 2014, dona Joana demonstrou a garra que possui. “Zequinha tinha tido quatro derrames, tomava remédio pra pressão e coração, mas ele estava bem, ele não era homem de mandar, nem ficar parado, ele fazia. Nesse dia tinha cuidado do gado e como de costume ele colocou a toalha no ombro e foi para o Córrego Barreiro banhar enquanto eu colocava o almoço na mesa. Como ele demorou chegar, fui atrás e de longe, vi que ele estava caído, morto às margens do Córrego. Enrolei ele em um pano e fui atrás de ajuda pra tirar ele dali”, relatou demonstrando ser uma guerreira mesmo nos momentos mais difíceis.
Apesar da idade, dona Joana é “dura na queda”. “Ainda mexo com gado, os filhos vem e olham, mas eu mesmo vou no pasto, quem olha meu gado é eu. Sou nascida e criada na lida, no gado, sempre nós tirava o leite, fazia o queijo, requeijão, mas depois que quebrei meu braço já não consigo fazer. Sou aposentada, mas quem cresce trabalhando não pode ficar quieta não, também mexo com galinhas, com os porcos”, disse sorrindo.
A pioneira destaca a contribuição dada para Aparecida. “Meu pai, Joventino Lino, deu as telhas para o telhado da Paróquia. A gente fica alegre em ver que a cidade tá bonita”, avaliou. Dona Joana também destacou o orgulho que tem dos filhos, “tenho filho professor, outra que é vereadora, a Leide, isso me deixa orgulhosa”, enfatizou.
Dude: Amor e zelo ao próximo
Quem mora em Aparecida do Rio Negro, com certeza já ouviu falar da casa de saúde construída pela irmã Antônia, na Avenida Sebastião Vasconcelos. O lugar, onde se conseguia atendimento, carinho e orientação espiritual se confunde com a própria história de vida de Maria de Jesus Vieira da Costa, conhecida como Dude.
Mãe de 10 filhos, sendo que seis são adotivos, é casada com Floriano de Sousa Batista e chegou ao povoado Meira Matos em 1971, depois de uma viagem de oito dias em cima de um caminhão vindo de Buriti Bravo, no Maranhão. “Meus pais moravam aqui, fui criada pelos meus avós. Aqui fui continuar meus estudos na escola construída na Praça José Eurico Costa, onde fiz até a quarta série”, contou.
Dude trabalhou no Mercado Sousa, o primeiro secos e molhados da cidade. “Lá tinha de tudo, de tecido até soda a granel”, relembrou. Aos 19 anos costurou seu primeiro vestido de noiva e já era conhecida na cidade como costureira. A partir daí, conheceu a Irmã Antônia, que encomendou com ela o enxoval para o posto de saúde. “Fiz cortinas, cobertas, toalhas, lençol, tudo para o posto de saúde”, afirmou.
Em 1978, quando o posto de saúde abriu, Dude integrou a equipe da unidade que se localizava em frente à sua casa. “A unidade foi construída em mutirão. A irmã Antônia me colocou na recepção do posto de saúde e a gente recebia pelas consultas em lenha, farinha, arroz. Em 1981, ela viu meu interesse em ajudar nos atendimentos e perguntou se eu não queria aprender mais. Claro que eu disse que sim, aí fui para Lins, em São Paulo, para fazer um treinamento para agente de saúde onde aprendi muito”, relembrou.
Nesse momento nasceu em Dude uma nova paixão: a saúde e o serviço ao próximo. “Aprendemos de tudo. O projeto não era apenas o posto de saúde, mas havia a horta, o projeto de construir privadas e melhorias nas casas como piso queimado, reboco. Isso durou 10 anos, visitava as casas com a Irmã Antônia, as pessoas a viam como a médica da cidade”, ressaltou.
Nos anos 90, houve mudança na direção, a irmã Antônia foi embora da cidade e o posto de saúde foi desativado. Nessa época, Dude concluiu seu estudo em Técnico em Enfermagem e começou a trabalhar na Unidade Básica de Saúde construída no governo de Moisés Avelino.
A saudade do tempo em que atendia as pessoas está latente ainda. “Gostava do que fazia, a pior coisa do mundo pra mim foi ter parado e ter me aposentado. Sei que dei a minha contribuição para Aparecida, são mais de 40 anos vividos aqui. Morar em frente onde foi a casa de saúde, onde comecei, também me dá muita saudade, se pudesse reconstruiria tudo”, destacou emocionada.
Maria de Jesus se mostra triste ao falar do setor de saúde atual. “Hoje a crise na saúde não é apenas falta de verba, o primeiro grave problema reside na falta de um bom atendimento, quando vejo a forma que as pessoas são atendidas na unidade me dá uma tristeza danada, muitos profissionais, não todos, trabalham apenas pelo salário, falta amor, falta dedicação. Quando se trata de seres humanos temos que ter outras atitudes, temos que ter amor próprio e zelo pelo o próximo”, lamentou.
Dona Nati: Sua fé supera qualquer problema
Maria da Natividade Barbosa de Araújo, mais conhecida como dona Nati, 79 anos. Entre os ingredientes para a sua longevidade estão o otimismo, fé, amor, alegria e humildade. Mas a pioneira reforça que a receita principal de sua vida é amar os filhos: Ramilson Barbosa; Goreth Barbosa; Cecília Barbosa; Célia Barbosa; Ernane Barbosa; Hélio Barbosa e não esquece da amada filha de criação Kênia Barbosa.
Sempre com sorriso discreto e mente serena, dona Nati cativa qualquer pessoa que se aproxima dela. Todas as tardes, se senta na porta de casa, em frente à Praça José Eurico Costa, e cumprimenta a todos que passam com o sorriso no rosto e a esperança de um dia superar a perca do marido, que partiu ainda muito jovem.
Desde que chegou ao município, vinda de Lizarda em 1983, em nenhum momento ela hesitou em lutar pela criação dos seis filhos. “Toda a vida meu marido labutou na roça de fazendas e eu acompanhei até quando compramos esta casa em que vivo até hoje. Ele era vaqueiro e eu cuidava da casa, fazia queijo, requeijão e muitas outras coisas da roça”, contou.
A casa onde reside, já foi de palha, e hoje, bem diferente do que foi antes, ainda é a residencia dessa linda senhora e de uma neta. Os seis filhos, todos já criados e casados, foram os responsáveis por dar à ela 10 netos e cinco bisnetos. “Aqui em casa graças a Deus não falta gente. Os filhos vêm aqui todos os dias. Os netos gostam até de dormir aqui. Não tenho do que reclamar, é só olhar para frente”, disse.
Basta ouvir sua voz rouca, cheia de entusiasmo para perceber que, para ela, não existe tempo ruim. “Para enfrentar os problemas da vida a gente basta ter fé em Deus e buscar dias melhores”, sugere.
Católica desde criança, ela nunca perdeu a devoção, principalmente à reza do terço e às demais tradições católicas. “A gente tem que acreditar que Jesus é nosso companheiro e nos dá forças. Eu gosto demais de ir pra Igreja, todo domingo e em dia de semana, não abro mão disso”, reiterou.
Emocionada, dona Nati disse que a vida mudou bastante e dias tristes vieram depois da perda do companheiro de vida. Seu Dorgival Ribeiro faleceu em 1992, aos 50 anos, vitima de um infarto. “O momento mais difícil veio nessa hora, depois de 25 anos de casados. Foi aí que tive que ter força, muita determinação e confiança em Deus. Tive ajuda de muitas pessoas boas aqui de Aparecida, que sou muito grata, que me ajudaram”, relatou.
Uma coisa é certa na história de Aparecida do Rio Negro: a presença marcante de dona Nati durante as festividades religiosas. Ao lado de alguns filhos, dona Nati faz questão de continuar a tradição do marido, participando ativamente durante os leilões de bezerros e gado doados à Paroquia Nossa Senhora Aparecida, da qual ela é frequentadora assídua.
Apesar do pouco estudo, ela se orgulha em dizer que os filhos hoje são profissionais importantes para o município. “Eu aprendi só a escrever o meu nome mesmo, e em casa. Mas graças a Deus os meus filhos todos estudaram, e hoje tem os que trabalham na Saúde, Segurança, Educação, na lida com o gado, e tenho certeza que todos contribuem para o desenvolvimento de nossa cidade, assim como muitas outras pessoas que ajudaram Aparecida a crescer”, enfatizou.