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Folha do Jalapão

Seu Panta alia dom, crença e benzimento na cura de pessoas

Postado em 29/07/2020

Benzedor guarda a sete chaves livro de orações que carrega consigo há 44 anos.

MATÉRIA ESPECIAL – Veiculada em Outubro de 2016 – Edição impressa 139 – por Nayla Oliveira –

Quantas vezes você já ouviu aquela famosa frase “vá se benzer”, após desabafar sobre os inúmeros problemas rotineiros?

União com dona Neusa já dura 49 anos: “a gente vive um para o outro”.

A moradia é simples. Em uma rua afastada do centro de Aparecida do Rio Negro, mas bem próximo às margens do Rio Negro. Mesmo modesto, o endereço é bem conhecido e frequentado e, atrai diariamente dezenas de pessoas. No quintal, plantas que lembram uma pequena horta. Um muro delimita o lote, mas a proteção, dizem os que visitam o endereço, vem dos céus! O portão de sua casa está sempre aberto, e por ele, passam diariamente dezenas de pessoas. Mas por que essa modesta residência vem atraindo centenas de pessoas de dentro e de fora do Tocantins nos últimos 26 anos?


Pois bem, é lá que vive Pantaleão Pinheiro de Souza, popularmente conhecido como “seu Panta”, 74 anos, maranhense; um senhor de baixa estatura, de pouco riso e que, apesar de ter sentado pouco em um banco de escola, se orgulha em dizer que aprendeu praticamente tudo sozinho.

“A minha escola foi o mundo, e o banco que sentei foi mais duro que o próprio chão”, relembra.


Ele se declara uma pessoa comum. É devoto do Divino Espírito Santo, o qual traz em sua pequena sala de atendimento a bandeira do protetor.

Entretanto, há quem diga, e não são poucos, que suas benzeduras são ‘’milagrosas’’ e espantam quebrante, olho gordo, espinhela caída, bucho virado, impotência sexual, amarração, dentre outros males. Muitos o procuram para alivio de sofrimentos. Em casos de crianças, o benzedor recorre aos ramos plantados em seu pequeno quintal, e após pequenas orações afirma que ao voltarem para suas casas, ficarão boas novamente.

Para quem não conhece, os benzedores são pessoas que recebem ensinamentos de seus antepassados sobre orações, ervas e simpatias, os quais são utilizados para curar àqueles que acreditam em suas preces.


Ao ser questionado sobre o motivo de as pessoas recorrerem a ele ao invés de um médico, “seu Panta”, prontamente responde:

“A reza é importante, mas o que cura é a fé. Se não tiver fé, não tem cura”, afirma o benzedor.

O procedimento realizado por ele segue uma tradição milenar: a cura através da reza. Um dom que ele acredita vir de Deus, que foi anunciado ainda quando era jovem, mas que só veio aceitar quando precisou ajudar na recuperação da esposa Neusa Alves, que passava por problemas de saúde. A vida não lhe reservava caminhos fáceis. Foi após uma viagem a Porto Nacional, na casa de Dona Mariinha, também benzedeira, onde buscou ajuda para a recuperação da esposa, que “seu Panta” teve a certeza que Deus havia lhe dado o dom de ajudar o próximo.

“Quem não vai por amor, vai pela dor. Assim aconteceu comigo”, analisa.


“Seu Panta” não cobra nada pelos atendimentos que presta.

“Aqui, a gente só cobra as garrafadas, por que temos que comprar o material para preparara-las. As pessoas que vem de longe chegam a dormir em casa e comer o que a gente come. Nunca posso negar oração a ninguém, seja rico ou pobre, branco ou negro, quem chegar primeiro será atendido primeiro”, assegura, deixando claro que, ao contrário do que muitos pensam, ele não faz nenhum ritual de consagração antes de rezar por uma pessoa.

“Até mesmo por que não sou eu quem curo, é Deus. Faço apenas o pedido da maneira certa”.


Ele explica que seus benzimentos podem ser feitos até mesmo à distância.

“Eu tenho muita fé, mas é necessário que a pessoa benzida também acredite; uma coisa eu asseguro, se a pessoa quiser ser curada com benzimento, ela vai ser, mas se ela quiser ser curada com remédio, só o remédio vai poder curá-la, não importando o tanto de rezas. Atendo dezenas de pessoas por telefone, muitos chegam a ligar até mesmo do exterior, pedindo ajuda, eu concentro em Deus e faço meus pedidos”, afirma.

Quando tudo começou

Sua chegada ao norte de Goiás foi em 1968. Na época que tinha apenas 14 anos. Foram percorridos cerca de 400 km a pé, sem hora e local certo para alimentar e descansar, chegando a ficar três dias sem comer e dormir dentro de algumas moitas de mato para se esconder dos animais. O que o fez percorrer esse longo caminho, foi a esperança de encontrar um parente.

“Eu não tinha pai, não tinha mais mãe, o jeito era buscar alguém que eu pudesse chamar de parente”, relembra.


Em busca de sustento, no decorrer dos anos que se passavam, foram várias as andanças do benzedor, até que que em um dia de festa conheceu Neusa Alves de Souza, com quem casou e teve 14 filhos.

“Depois de algumas prosas, eu ofereci a ela uma carona na garupa do cavalo, e não é de ver que ela aceitou? ”, brinca.


“Seu Panta” cresceu em um mundo de poucos amigos, sempre foi reservado e gostava mais de ficar só. Uma das coisas que ele lembra que gostava mesmo era de namorar. O serviço pesado, obrigava-o a descansar cedo, pois a labuta do dia seguinte era grande, período esse que tinha que manter a família com trabalho braçal. O despertar sempre acontecia às 4 horas da manhã.


A união com dona Neusa já completou 45 anos, e de acordo com o casal, hoje o relacionamento dos dois é bem melhor.

“A gente, hoje, vive um para o outro. O tempo que nos resta, dedicamos em atender as pessoas que buscam por ajuda”, diz.

Vidência

Foi em uma certa tarde, após recorrer à ajuda de dona Mariinha, em Porto Nacional, quando buscou ajuda para salvar a vida da esposa, que “seu Panta” sentiu na pele o peso da responsabilidade de ajudar o próximo.

“Fui chamado por uma moradora daquela cidade, que me pediu que fosse até sua fazenda ver o que estava acontecendo, pois, todo o gado estava morrendo. Naquele momento, eu fui no outro mundo e vim, porque eu não sabia de nada gente. Eu iria fazer o que”?


“Susto”. Assim define o benzedor, que ao chegar na fazenda só viu ossos e caveiras de bois, além de bagulhos enterrados.

“Fiquei olhando e pensando o que poderia fazer? Ajuntei tudo aquilo e toquei fogo, e pedi a Deus que não deixasse mais aquilo acontecer. Foi tudo que veio na minha mente. Retornei para meu destino, com a certeza de que daquele dia em diante nenhuma vaca morria mais naquela fazenda”, conta.

No retorno para a cidade, “seu Panta” tinha a certeza que Deus havia atendido seu pedido, pois levava em seu coração a sensação de que sua vida mudaria a partir daquele dia.


As primeiras orações foram dedicadas à esposa, que passava por dias difíceis, mas com sua recuperação os vizinhos começaram a procurar “seu Panta” em busca de ajuda. E a cada dia a história do benzedor ia se espalhando. Para fugir um pouco das especulações, a família resolveu mudar para Aparecida do Rio Negro. Isso em torno de 1994, mas a conversa já havia se espalhado e ele começou a ser procurado por fazendeiros locais.

“Até que um homem veio de Brasília pedir para eu benzer suas terras, pois as coisas por lá não andavam nada bem”, lembra. As partir daí as portas da casa do benzedor se abriram para todos.

Sufocos, alegrias e tristezas

E quem disse que benzedor também não passa sufoco? Imagina uma onça lhe atacando, avançando sobre você? O jeito é se defender para garantir sua sobrevivência. A sorte de “seu Panta” foi um amigo que andava com ele. Mas, o corpo ainda levou alguns arranhões e sua roupa praticamente toda rasgada, devido ao infortúnio confronto. Outra “presepada” do benzedor foi tentar pegar um bezerro para amarrá-lo, quando a mãe do animal na tentativa de socorrer o filho, deu várias chifradas em “seu Panta”. Há, se não fosse dona Neusa o ajudar, o homem teria passado por maus lençóis.


Não ter a oportunidade de conhecer o pai e crescer ao lado da mãe, ainda são lembranças amargas, que “seu Panta” traz estampadas no rosto.

“A gente só sabe a importância de um pai quando a gente não teve a oportunidade de viver com um”, relembra triste.

As marcas em suas pernas ainda são pesadas lembranças, mas que as rezas não curam. Em um grave acidente de moto, ele quebrou a pena. Luta até hoje pela recuperação. Ao ser questionado por que não busca a cura para sua perna, já que tanto ajuda os outros, o benzedor responde:

“Eu busco ajuda para mim também minha filha, mas tem coisas que só Deus mesmo para entender”.

Sala da cura


Na sala de cura de “seu Panta”, a bandeira do Divino Espirito Santo é posta sobre um altar. A imagem de Nossa Senhora Aparecida, entre outras, faz parte da decoração. Velas, incensos, livros de orações e uma grande bíblia também ficam expostos sobre a mesa daquela humilde sala, que abre as portas diariamente para receber quem chega em busca de ajuda. No canto do altar, o livro que “seu Panta” ganhou de presente há 44 anos ganha espaço. Ele faz questão em mantê-lo à sua frente. Ao ser questionado sobre como ele se sente em poder ajudar quem acredita no que ele faz, ele afirma:

“O que eu faço, eu não escondo, pois a verdade não se esconde. Tudo que eu falo e o que eu faço está na palavra de Deus. Ele é o poder eu só sou o instrumento dele”, finaliza.

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